Saúde mental dos idosos exige mais atenção durante a pandemia

Segundo relatório da ONU, terceira idade é mais vulnerável a sofrer os efeitos psicológicos da quarentena. Psicólogos e terapeuta ocupacional do Programa da Maturidade da Estácio orientam familiares e cuidadores no suporte emocional




Cotidiano

O novo coronavírus impôs uma série de desafios à população, dentre eles, manter a saúde mental durante a quarentena. Os idosos representam o grupo mais vulnerável a sofrer efeitos psicológicos junto àqueles que estão na linha de frente no enfrentamento à Covid-19, portadores de doenças crônicas, crianças e mulheres, segundo um documento das Nações Unidas sobre o aumento dos sintomas de depressão e ansiedade relacionados à pandemia. 

De acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a depressão quase dobra na faixa etária de 60 a 64 anos entre os 11,2 milhões de brasileiros diagnosticados com a doença. Com a pandemia, a atenção e os cuidados com os idosos precisam ser redobrados não só por serem considerados um dos mais suscetíveis às complicações da Covid-19 como também para manter sua integridade mental.

Para os psicólogos e a terapeuta ocupacional do Programa da Maturidade da Estácio, respectivamente, Renata Mafra, Marco Antônio Lobo e Patrícia Tavares, familiares, cuidadores e rede de apoio familiar e social forte e presente – para idosos que moram sozinhos – devem ficar atentos aos indícios de que algo não vai bem no aspecto emocional.

“Os principais sinais são os transtornos de humor, exaltação ou tristeza exagerada, diminuição ou aumento de apetite, perda da vontade e do desejo em fazer atividades em casa”, pontua Marco Antônio. Patrícia Tavares complementa: “O surgimento de muitos sintomas físicos ou queixas frequentes de dores, sem que haja uma causa orgânica, também indica que o quadro emocional deve ser melhor avaliado”.

“Quem conhece o idoso, seus hábitos e sua forma de expressão observará uma mudança no padrão de comportamento, tais como, medo excessivo (de adoecer e morrer, de perder alguém da família, de pegar o vírus ou de transmiti-lo, de ficar sem dinheiro para sua subsistência ou de depender de alguém); irritabilidade, angústia, impotência, desamparo, tédio, solidão, alterações ou distúrbios do sono, conflitos interpessoais, pensamentos recorrentes sobre a epidemia, o contágio, a saúde da família, a morte e o morrer, agitação psicomotora”, descreve Renata Mafra.

Para ajudá-los a não esmorecer, Patrícia Tavares destaca que as medidas adotadas devem considerar a singularidade de cada idoso. “O histórico ocupacional, a condição financeira, o condicionamento físico, o capital cultural, o suporte familiar, todas essas variáveis afetam diretamente a resposta que cada idoso é capaz de dar a esse desafio que estamos vivendo”, afirma.

Os especialistas recomendam acolhimento, conexão, adoção de uma rotina e prática de atividades lúdicas e físicas respeitando o ambiente em que o idoso vive, como:

·         Manter e criar uma rotina bem próxima da que existia, considerando a necessidade de isolamento e as medidas de prevenção;

·         Reservar momentos de interação com a família, contação de histórias para os netos, memórias dos tempos antigos;

·         Identificar se sabe utilizar as redes sociais, se tem equipamentos e boa conexão de internet. Netos costumam ser ótimos para ensinar, além de promover encontros agradáveis entre eles, ainda que de forma remota;

·         Identificar quais pessoas estavam presentes no cotidiano antes do isolamento e ajudar a criar a manutenção desses contatos no formato digital;

·         Livros para colorir, para ler, linhas para bordar, terra e vasos para plantar e cultivar são formas de ocupar o tempo, a mente e promover bem-estar;

·         Identificar um local e uma forma para banho de sol, atividade física e pequenas caminhadas com segurança;

·         Estimular a prática de algumas atividades dentro de casa, por aplicativos ou vídeos no YouTube, como meditação e yoga.

·         O apoio espiritual, a manutenção de práticas religiosas e de oração no formato virtual são reconfortantes.

Segundo Patrícia Tavares é fundamental garantir ao idoso sua autonomia: “Um dos maiores presentes que podemos dar a um idoso é o direito de gerir seu tempo de vida”. Renata Mafra acrescenta que, se necessário, deve-se buscar suporte psicológico remoto e que o auxílio de médicos assistentes para os cuidados físicos também são importantes.  

Para quem apresenta alguma enfermidade, como mal de Alzheimer ou Parkinson, os desafios são maiores no âmbito emocional, requer mais vigilância do familiar ou cuidador e um acompanhamento multidisciplinar próximo, de acordo com Marco Antônio Lobo. Com ajuda profissional, é possível implementar algumas estratégias de estímulo à orientação do idoso para a realidade, como ilustra a terapeuta ocupacional Patrícia Tavares:

“Construir um painel ou um quadro, no qual diariamente o idoso colocará o dia da semana, o dia do mês, o ano, ou alguma outra informação especial. Elaborar com o idoso uma agenda semanal, que também fique em lugar de fácil visibilidade, ajuda a pessoa idosa com desorientação temporal e espacial a organizar sua percepção. O planejamento de uma rotina também é de grande importância. Outro aspecto fundamental é o cuidado com o cuidador. Os cuidadores de idosos dependentes apresentam alto risco para os transtornos do humor. Por isso, é importante que os familiares se revezem no cuidado ao idoso ou que dividam tarefas, de forma a evitar a sobrecarga de um dos cuidadores. Quanto mais o cuidador se sente apoiado, melhor é o cuidado ofertado ao idoso”, elucida a terapeuta.

Os profissionais do Programa da Maturidade lembram que um público que pode sentir com mais intensidade, neste momento da pandemia, solidão, saudade e ansiedade, são aqueles que vivem em casas de repouso, pois as visitas estão suspensas.

“Conexão é a chave de todo cuidado afetivo e “efetivo”. É a disponibilidade interna para realmente estar com o idoso: presencialmente ou on-line. Perguntar como ele tem se sentido de verdade, do que ele necessita e escutar as respostas. Enxergar a pessoa idosa: dar voz ao sujeito que está por trás dos rótulos “grupo de risco” e “terceira idade”. São pessoas que trazem uma força e um saber que talvez estejam soterrados nos escombros de tudo o que temos experimentado. Podemos ajudá-las a resgatar o que ainda está vivo dentro delas”, relata Patrícia Tavares.

Marco Antônio Lobo reforça que no atual cenário, para substituir as visitas presenciais à casa de repouso, familiares podem e devem fazer ligações ou até mesmo utilizar da tecnologia, se a estrutura do local permitir, para o idoso se aproximar mais dos entes queridos.